A importância da Cinemateca Brasileira

A importância da Cinemateca Brasileira

 

O incêndio na maior instituição de preservação da memória audiovisual do país levantou questões sobre a necessidade de valorização da nossa cultura

Por que é tão importante preservar o patrimônio audiovisual brasileiro? Qual o propósito de instituições como a Cinemateca Brasileira? Para muitos, pode ser difícil calcular o valor concreto de conceitos abstratos como a arte e a cultura. Mas o recente incêndio que destruiu parte do acervo da Cinemateca levantou questionamentos sobre a forma como percebemos e cuidamos de nossa memória audiovisual.

A Cinemateca Brasileira foi fundada em 1946. À época, o Segundo Clube de Cinema de São Paulo tinha como proposta estudar o cinema por meio de projeções, conferências, debates e publicações. Ao longo das décadas, passou a desenvolver atividades para conservar e difundir o acervo audiovisual do país, com uma coleção de mais de 250 mil rolos de filmes e mais de um milhão  de documentos relacionados ao cinema nacional.

Além de todo o acervo contido em seu interior, um dos prédios que sediam a instituição, na Vila Mariana, também faz parte da história brasileira. Trata-se do antigo Matadouro Municipal, projetado pelo arquiteto Alberto Kuhlman por volta de 1887 e tombado pelo Condephaat, órgão estadual de preservação do patrimônio histórico.

A Cinemateca Brasileira possui a maior coleção de imagens em movimento da América do Sul. Encontram-se no local inúmeros materiais cinematográficos produzidos nacionalmente (assim como algum conteúdo estrangeiro). Além de filmes, o acervo conta com livros, revistas, fotografias, roteiros e cartazes. Seu laboratório audiovisual  já foi considerado um dos maiores do mundo, com equipamentos para processamento de película, vídeo e digital.

Seu principal objetivo é preservar, sem juízo de valor, a maior quantidade possível de materiais de obras audiovisuais produzidas no país, para que as futuras gerações possam ter acesso a eles. Essa preservação não diz respeito apenas a filmes para o cinema, mas filmes feitos para a televisão ou internet, obras publicitárias, cinejornais, filmes científicos, registros domésticos e obras amadoras, quer tenham sido exibidos publicamente ou não.

Foto: El País

Foi no final da tarde de 29 de julho deste ano que o fogo atingiu a unidade da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina, possivelmente provocado por um curto-circuito no sistema de ar-condicionado. O incêndio danificou o acervo documental, estimado em quatro toneladas de documentos de órgãos extintos do audiovisual, como a Embrafilme – Empresa Brasileira de Filmes S.A. (1969-1990), INC – Instituto Nacional do Cinema (1966-1975) e Concine – Conselho Nacional de Cinema (1976-1990). Além disso, parte do acervo em películas de acetato foi atingido, provocando perdas irreparáveis.

Esse é o quinto incêndio registrado na história da organização – os outros ocorreram em 1957, 1969, 1982 e 2016. Muitos afirmam que o incêndio mais recente foi uma tragédia anunciada, em decorrência da falta do repasse de verbas federais para a Cinemateca Brasileira e da ausência de equipe técnica há mais de um ano. O Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP) já havia alertado sobre perigo de incêndio, tanto na sede da Cinemateca na Vila Mariana, quanto nos galpões da Vila Leopoldina.

No entanto, o fogo não é a única ameaça ao acervo e à estrutura da Cinemateca Brasileira. A instituição tem passado por diversas crises ao longo das últimas décadas, tanto no que diz respeito à gestão quanto aos recursos necessários para sua adequada manutenção. Em fevereiro de 2020, por exemplo, no mesmo local do incidente deste ano, houve um alagamento que destruiu parte do acervo documental, audiovisual e equipamentos alocados no galpão. O descaso da administração pública potencialmente está causando danos ao acervo e ao parque tecnológico da instituição, além de promover a dispersão de seu corpo técnico especializado.

 

Por que preservar o acervo audiovisual brasileiro?

A importância da Cinemateca Brasileira não está somente em seu trabalho pela conservação e restauração de obras relativas à produção audiovisual no país. Como instituição, ela representa um posicionamento indispensável a qualquer nação, de reconhecimento e valorização da própria cultura.

Um país que tem consciência da necessidade de preservação, pesquisa e disseminação de suas obras audiovisuais, de modo que toda a sociedade possa se beneficiar e ter seus conhecimentos enriquecidos a respeito do seu patrimônio cultural, tem maiores chances de se tornar um país mais desenvolvido, igualitário e próspero.

Fonte: Revista Piauí

A relevância da Cinemateca Brasileira não está somente em seu acervo, mas nas ações voltadas à divulgação e exibição dos conteúdos que abriga, fomentando pesquisas e promovendo debates e reflexões. Ainda que suas atividades tenham sido cessadas provisoriamente, a função dessa instituição cultural é permanecer de portas abertas para os interessados, sejam eles do meio audiovisual (cinéfilos, estudantes, pesquisadores, profissionais da área) ou não.

As obras audiovisuais, como um todo, são formas de ampliar a perspectiva das pessoas sobre o mundo em que vivem. A indústria cinematográfica, em grande parte, tende a preencher as salas de cinema com grandes produções hollywoodianas, já que seu objetivo é o sucesso de bilheterias. Nesse sentido, instituições como a Cinemateca possibilitam aos cidadãos o acesso a obras independentes, que se aproximam mais do conceito de cinema como “sétima arte”. 

A conservação do legado, da identidade e da memória de um povo é uma responsabilidade enorme. Por isso, a Cinemateca Brasileira precisa ser vista como o bem precioso que é. Afinal, um país que não preserva seu patrimônio cultural não tem condições de construir seu futuro.

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